O impacto da Covid-19 nas intenções de migrar de África para a Europa
A pandemia da COVID-19 veio limitar ainda mais as oportunidades de emigrar de forma legal de África para a Europa. O encerramento de fronteiras foi um mecanismo usado pela maioria dos países para travar a propagação do corona vírus. Apesar de dificultar as migrações, este mecanismo não diminuiu a vontade de emigrar, muitas vezes de forma irregular – há aliás dados que indicam precisamente o contrário. Perante este cenário, é urgente encontrar vias legais e seguras de acolher estas pessoas que vêm legitimamente à procura de realizar as suas aspirações.
Nos últimos meses, no atual contexto pandémico, milhares de pessoas da África Ocidental continuaram a tentar chegar de forma irregular à Europa por via marítima, tanto no Mediterrâneo como no Atlântico, com destaque para as ilhas Canárias. Em 2020 mais de 20 mil pessoas, vindas do Senegal, Marrocos e outros países da costa ocidental de África tentaram chegar a estas ilhas numa tentativa desesperada de chegar ao velho continente.
Contrariamente à situação pré-pandémica, os mais recentes grupos de migrantes irregulares incluem famílias inteiras, ao contrário da tendência anterior que era a de os migrantes serem essencialmente jovens a viajar sem família.
Num estudo recente que o centro NOVAFRICA agora publicou baseado em dados que recolhidos junto de 4000 potenciais emigrantes da África Ocidental, observou-se que muitas destas pessoas (as mais pobres e com menos formação académica) adiaram as suas decisões de migrarem para a Europa. A crise económica provocada pelo COVID-19 coloca-os numa situação de pobreza agravada que não lhes permite pagar os custos de emigrar, no entanto as intenções de vir para a Europa num futuro próximo continuam altíssimas.
A verdade é que existem poucas oportunidades legais de migrar para a Europa e por isso a maior parte dos migrantes africanos fazem-no de forma ilegal.
Uma jornada cara e perigosa feita através do que é chamado “o caminho de trás” – uma viagem por terra com início em países da África Ocidental, através do deserto do Saara até a Líbia e, em seguida, atravessando o Mediterrâneo para Itália e outros destinos europeus.
As imagens de jovens africanos em barcos de borracha lotados no Mar Mediterrâneo tornaram o fenómeno uma importante questão política e humanitária que a pandemia não travou. Exemplo disso, foi o mais recente caso de 8000 pessoas (incluindo quase 2000 menores de idade) que chegaram a Ceuta em apenas 2 dias. Os migrantes africanos chegados através de Marrocos tentavam desta forma chegar à Europa através do enclave espanhol.
Este é um episódio que choca e capta a nossa atenção porque são números muito maiores do que o habitual, mas é apenas mais um episódio numa situação com tendência para se agravar nos próximos anos.
Estas tentativas são muito graves não só pela falta de capacidade europeia para acolher estes migrantes, mas especialmente porque esta forma de imigração é extraordinariamente arriscada: têm-se perdido inúmeras vidas. Estes migrantes que tentam chegar à Europa são por norma os mais educados, os mais empreendedores das suas regiões de origem, enfim aqueles que poderiam contribuir mais para o crescimento económico da Europa e de África.
A abertura de corredores legais de migração seria a melhor forma de permitir que os países europeus integrem estas pessoas de uma forma digna e produtiva, o que ajudaria ao próprio crescimento económico e equilíbrio demográfico da Europa, ao mesmo tempo que poderia contribuir para o crescimento económico de África através das remessas financeiras e imateriais para os seus países de origem.
Para além dos fluxos financeiros que os migrantes africanos enviam para as suas famílias, muito contribuindo para a melhoria das suas condições de vida, estes migrantes passam valores de empreendedorismo, investimento na saúde e educação e exigência democrática que se traduzem em melhores instituições e melhores perspetivas económicas nos seus países de origem.
Cátia Batista, Diretora do NOVAFRICA e Professora de Economia na Nova SBE.
Artigo publicado na Forbes África Lusófona