Quem tem medo de urbanizar?
Desde a revolução verde dos anos 50 e 60, que pusemos todos na cabeça que o desenvolvimento do continente Africano passa por melhorar a sua produtividade agrícola. Acontece no entanto que na maior parte dos países Africanos a norma é a agricultura de subsistência. Como se consegue então melhorar a produtividade agrícola naquelas paragens?
Em teoria de duas maneiras: 1. melhorando a produtividade agrícola de cada um daqueles agricultores de subsistência, ou 2. promovendo a migração destes mesmos agricultores de subsistência para a cidade tentando focar numa agricultura mais virada para o mercado e exportação, com maior dimensão e mais investimento.
Temos estado a tentar a opção 1, de melhorar a produtividade dos agricultores de subsistência, há mais de 50 anos. As organizações internacionais de desenvolvimento, os doadores bilaterais, os governos Africanos têm insistido e voltado a insistir nesta fórmula. Os resultados estão à vista: nada, a produtividade agrícola do continente Africano não mexe. São biliões em fertilizantes e sementes melhoradas, assistência técnica, campanhas informativas, alguma infraestrutura. Subsídios e empréstimos a fundo perdido que ocuparam uma parte substancial dos orçamentos de Estado, que encheram discursos políticos. A agricultura de subsistência lá continua, sem conseguir quebrar o ciclo de pobreza associado.
Que tal pensarmos mais na opção 2, de promover a migração rural para as cidades de uma forma regrada, não repentina, e bem pensada, com boas políticas públicas e coordenação entre poder central e local?
Não tem sido fácil. O processo de urbanização vai tipicamente contra os interesses dos partidos políticos no poder, que controlam bem os eleitores em espaço rural e menos bem os do espaço urbano, onde a oposição jovem normalmente desponta. Para um extra-terrestre, até poderá parecer que estes partidos no poder se alimentam destes ciclos de pobreza rural… Talvez seja por isso que é assunto tabu em muitos países Africanos a reforma da propriedade da terra, amiúde nas mãos do Estado como se estivéssemos na União Soviética, ou por outra palavras, nas mãos de chefes locais controlados pelos partidos no poder.
Deixemo-nos então de politiquice e falemos de desenvolvimento. Para o desenvolvimento acontecer é inescapável urbanizar. Quanto mais depressa e melhor o fizermos, maior será o sucesso económico destes países de que tanto gostamos. Os partidos no poder vão perder eleições? Talvez. Mas não é esse o futuro de qualquer país democrático? Para urbanizar bem e depressa temos de nos dedicar a desenhar boas políticas públicas. E aí há muito para fazer: inclusão financeira que permita remessas a baixo custo de migrantes para as suas casas na zona rural, formação profissional de migrantes, subsídios a residentes para a integração de migrantes, e um financiamento apolítico dos poderes locais. É preciso ler sobre o que já foi tentado envolvendo as universidades, é preciso testar, é preciso errar em pequeno, para fazer bem em grande. Vamos a isso?
Pedro C. Vicente, Professor da Nova SBE, Diretor Científico do NOVAFRICA
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