Tabanca de Suzana, um lugar mágico: My Summer Research Internship
No verão de 2019 tive a oportunidade de trabalhar num projeto de investigação do NOVAFRICA através dos seus programas de estágio. Sendo um estudante de mestrado com particular interesse em Economia do Desenvolvimento, uma área na qual me pretendo focar como futuro investigador, considero que foi uma experiência bastante enriquecedora em importantes e diversos componentes do que é um estágio de investigação. Não só foi possível aplicar os conhecimentos que adquiri ao longo do último ano letivo, enquanto estudante, como tive a oportunidade de aprender muito mais sobre o que é o trabalho de ‘campo’, onde encontrei vários desafios no dia a dia como assistente de investigação a trabalhar neste contexto.
A minha experiência teve lugar em Suzana, na Guiné Bissau, uma aldeia remota, longe da capital Bissau (não tão longe em distância como em horas de viagem). Depois de aterrar em Bissau e ficar por alguns dias, para comprar comida e água para todo o mês seguinte (não há supermercados em Suzana, de tipo algum) e alguns outros bens essenciais, como materiais de escritório que iriam ser necessários para a realização das atividades de campo, finalmente iniciámos a nossa curta mas demorada viagem até Suzana. Foram 150 quilómetros feitos em 6 horas de viagem, num grande jipe que andava por estradas esburacadas e de terra batida, todo o caminho aos saltos até chegar ao destino. O destino, Suzana, é um lugar mágico. O calor estonteante dos trópicos e andar perdido pela cidade caótica, mas muito acolhedora de Bissau tinha ficado para trás. Ao chegar a Suzana senti que estava numa outra dimensão, num sítio remoto, dentro da floresta, no meio da natureza e do seu estado mais puro. Todas as paisagens naturais que rodeavam e se misturavam com a aldeia, características das zonas rurais da Guiné Bissau estavam presentes em Suzana. Desde os verdes fortes e densos aos campos extensos de arrozais emergidos em água (as ‘bolanhas’), às casas tradicionais com telhados de palha, e aos animais de criação domésticos que andavam soltos pelas ruas enlameadas de Suzana até às cobras que por duas vezes me apareceram à porta de casa, a natureza estava por toda a parte, numa forma muito única e autêntica.
Ia ficar em Suzana dois meses. O tempo era curto para todo o trabalho que era preciso desenvolver. Será importante notar que tudo o que pode ser feito com agilidade e rapidez num contexto de trabalho ao qual eu estava habituado, num lugar tão remoto como Suzana, torna-se num cenário de trabalho complexo e desafiante onde a rede é fraca, e as comunicações lentas e por vezes até inexistentes, devido às fortes tempestades – por vezes um pouco assustadoras – que aconteciam todas as semanas. Felizmente fomos sempre capazes de ultrapassar as limitações e foi possível completar todas as tarefas no tempo devido.
Fui colocado no projeto “Belief Systems and Health Behaviors in Guinea Bissau” – “mutualidades de Suzana”, um projeto na área da saúde, em parceria com a organização VIDA. O projeto de mutualidades de Suzana funciona de forma semelhante a um seguro de saúde, mas beneficia do envolvimento da comunidade no projeto. Explicando de forma sucinta, os habitantes locais que decidam aderir ao programa pagam uma quota reduzida, mensal ou anual, e podem beneficiar de consultas gratuitas e ilimitadas no centro de saúde de Suzana, dos medicamentos que necessitem e lhes sejam prescritos, assim como de deslocação gratuita para o hospital mais próximo em caso de maior necessidade. Eu estava responsável pela promoção do projeto e pela intervenção de campo, que tinha por objetivo aumentar a taxa de participação da comunidade no programa da mutualidade. Também, de forma a que fosse possível analisar e medir, posteriormente, o impacto da intervenção, foi necessário fazer nova recolha de dados. Assim, durante a minha estadia, realizaram-se várias atividades de campo, tais como preparar e testar os questionários, treinar e coordenar a equipa de inquirição que, dia a dia aplicava os inquéritos porta a porta por todos os agregados familiares de Suzana, preparar a intervenção, e desenvolver uma sessão de treino com as mulheres líderes da comunidade de Suzana, que iriam atuar como promotoras do projeto. Finalmente, foi ainda realizada a recolha de dados pós intervenção de forma a que fosse possível avaliar o impacto da mesma. Isto é, se o trabalho realizado pelas mulheres promotoras teve impacto na taxa de participação no programa da mutualidade. Uma outra parte importante do trabalho que realizei consistiu em fazer a gestão e limpeza dos dados recolhidos.
Claro que a maior parte da experiência foi focalizada no trabalho, na aprendizagem, na resolução diária de obstáculos onde em cada novo dia surgiam desafios e por isso relevo o desenvolvimento de competências profissionais que me servirão no futuro. Mas o que mais me marcou pessoalmente nos dois meses que vivi na Guiné Bissau foi sem dúvida todo o contacto que tive com as pessoas locais, todas as pessoas que conheci ao longo da minha estadia, os amigos que fiz e os sorrisos que partilhei com as pessoas de Suzana. Os guineenses são um povo muito acolhedor, sempre disponíveis, cheios de vontade de conversar, partilhar histórias e momentos com pessoas de fora e criar uma relação próxima de amizade. À medida que fui aprendendo a falar crioulo, fui-me também aproximando das pessoas e foi possível conhecer melhor a cultura guineense, que é tão rica e diversificada, com uma diversidade enorme de grupos étnicos, de tradições e tanto mais por descobrir. Fiz verdadeiros amigos, que me fizeram sempre sentir em casa, que partilharam histórias comigo e com quem eu partilhei histórias minhas, que me convidaram para visitar as suas casas, conhecer as suas famílias e me sentar a comer e conversar com os seus familiares. Tive até a oportunidade de jogar futebol no grande estádio de Suzana com os jovens locais. Foi um grande jogo!
Escrito por Simão Paiva, estudante do Mestrado de Economia da Nova SBE e membro do NOVAFRICA Student Group.